Desconto de salário e de benefícios devem ser revertidos de forma imediata, diz decisão judicial.
A Prefeitura de Araraquara (SP) foi condenada por recusar atestados médicos de servidores da área de saúde que se afastaram para tratar filhos com Covid-19.
A sentença da 2ª Vara do Trabalho de Araraquara determinou a reversão imediata, independente do trânsito em julgado, dos descontos salariais e supressão de benefícios, como tíquete alimentação, sob pena de multa de R$ 2 mil por situação irregular constatada.
A decisão também impõe ao Município o pagamento de indenização individual de R$ 2,5 mil a cada trabalhador prejudicado e o pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 30 mil. Cabe recurso ao Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região.
A Prefeitura de Araraquara disse que não foi intimada da decisão judicial e, assim que estiver ciente, providenciará o recurso cabível, dentro dos prazos legais.
Investigação
Trabalhadores do setor da saúde que apresentaram atestado médico, em 2022, prevendo afastamento do trabalho, por ser contactante e precisar cuidar de crianças, adolescentes e pessoas incapacitadas positivadas para Covid-19, tiveram os documentos não aceitos pelo poder municipal.
A denúncia foi feita ao Ministério Público do Trabalho (MPT) pelo Sindicato dos Servidores Municipais de Araraquara e Região (Sismar), com base no caso de uma enfermeira que teve que arcar com os custos de seu afastamento para cuidar do filho de apenas 11 meses, positivado com Covid-19, uma vez que o Município recusou o seu afastamento, apesar de previsto em atestado médico.
A investigação conduzida pelo MPT concluiu que a prefeitura estava recusando os atestados e passou a interpretar os afastamentos como falta injustificada, efetuando descontos no salário e benefícios dos servidores, muitos deles mães de crianças pequenas, que ainda assim faltaram ao trabalho para cuidar dos filhos doentes.
O MPT tomou depoimentos de profissionais de saúde que viveram experiências parecidas, atingidos pela recusa do Município em aceitar os atestados médicos, e que tiveram que ficar em casa e cuidar de seus familiares incapazes, arcando com os custos decorrentes dos descontos salariais.
“Os depoimentos revelam a futilidade da medida, que impõe sacrifício salarial às trabalhadoras a troco de nada, sendo óbvio que uma mãe, que não tem outra pessoa em seu entorno que possa se responsabilizar por uma criança doente em isolamento social, irá ausentar-se ao trabalho ainda que sem autorização, pois a alternativa seria deixar a criança doente desassistida”, afirmou o procurador Rafael de Araújo Gomes.
Segundo o procurador, a medida ainda era ineficaz pois os profissionais acabavam se contaminando e não poderiam mesmo trabalhar.
“A futilidade da regra, injusta e discriminatória, também é evidenciada pela previsível consequência revelada pelas testemunhas, que em sua maioria positivaram para Covid-19 dias após os filhos, como era de se esperar, pois é inviável o isolamento completo de crianças pequenas dentro da mesma residência. A medida gera exatamente o efeito que pretende evitar, que é a carência de profissionais da saúde, pois com filhos doentes em casa, crianças inclusive, é inevitável que tais trabalhadores acabassem também adoecendo, e desfalcando os quadros por tempo inclusive superior, comprometendo o pleno funcionamento dos serviços públicos de saúde”, afirmou o MPT.
Condenação
O MPT propôs à Secretaria de Saúde municipal uma solução extrajudicial, que foi recusada pela municipalidade, levando ao ajuizamento da ação civil pública.
A juíza Conceição Aparecida Rocha de Petribu Faria escreveu, na sentença, que a conduta do Município “manifesta ofensa aos princípios fundamentais da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho”, e que ao deixar de reconhecer as faltas justificadas dos trabalhadores, assume o “risco de transgredir voluntariamente as normas básicas de proteção do trabalhador, especialmente daquelas relativas à sua saúde e segurança”.
Fonte: G1 São Carlos e Araraquara